Restrição ao EaD na área da saúde é consenso entre entidades e parlamentares

A flexibilização do ensino à distância (EaD) na graduação em saúde foi debatida em audiência pública na manhã desta terça-feira, 15 de maio, na Câmara dos Deputados. Promovida pela Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF), a discussão foi proposta suprapartidária dos deputados Alice Portugal (PCdoB-BA) e Mandetta (DEM-MS). Alice Portugal é autora do Projeto de Lei nº 5414/16, que veta essa modalidade de ensino na área, e Mandetta, o relator. Ambos defenderam providências urgentes contra os efeitos do Decreto Federal nº 9.057/17 e da Portaria Normativa nº 11/2017, do Ministério da Educação, que flexibilizaram as regras e a fiscalização dos cursos a distância.

Ao final da audiência, na qual estiveram representados à mesa, o Fórum dos Conselhos Federais da Área da Saúde (FCFAS), os conselhos federais de Farmácia (CFF) e de Enfermagem (Cofen), o Conselho Nacional de Saúde (CNS), o Ministério da Educação (MEC), a Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed), Alice Portugal pediu moratória para a autorização de novas vagas de EaD na área da Saúde. Ao mesmo tempo, conclamou os conselhos profissionais a cobrarem, providências do Ministério Público, em relação à precarização da formação. “Que o façam em nome da saúde da população brasileira”, assinalou ela, tecendo duras críticas ao Conselho Nacional de Educação, que autoriza os cursos, mas não compareceu à audiência para debater os problemas a eles relacionados.

O deputado Mandetta anunciou que não medirá esforços para que a questão seja tratada com a seriedade que ela merece e criticou o decreto federal e a portaria que o regulamentou. “A educação tem sua vocação para abrir matrículas, formar as pessoas, porém isso terá de ser feito não com um texto aberto e genérico como esse. Não gostaria, mas se precisar, vou chegar ao ponto de avaliar profissão por profissão, cadeira por cadeira, para ver qual pode e qual não pode ter EaD.” Para subsidiar seu relatório ao projeto de lei que restringe o EaD na área da saúde, ele anunciou que se reunirá com representantes das profissões e buscará informações no MEC no Palácio do Planalto.

Alguns dos dados que o deputado vai usar para a elaboração do documento serão encaminhados pelo CFF. Fazem parte da apresentação feita durante a audiência pública, pela assessora da Presidência do CFF, Zilamar Costa, que também falou em nome do FCFAS. A partir de informações coletadas no Sistema E-MEC, ela demonstrou que já somam mais 600 mil as vagas de EaD autorizadas em 10 das 14 profissões da saúde. Em 13 meses após o decreto, houve um aumento de 124% de vagas disponíveis em EaD. “A grande maioria dos cursos tem entre três e quatro encontros presenciais por semestre. É impossível aprender saúde assim”, criticou. Zilamar Costa denunciou que a flexibilização do ensino a distância na graduação em saúde leva a uma banalização da educação. “Estão pensando em números, mas não em qualidade”.

Os dados se contrapuseram à defesa feita pela diretora de regulação do ensino superior no MEC, Patrícia Ferreira, e também por Carlos Robero Longo, da Abed. Patrícia defendeu que, para o ministério, EaD não é ensino de segunda grandeza. “Os cursos têm momentos presenciais e à distância, de acordo com cada curso”, explicou. Carlos Roberto Longo disse que o crescimento na educação superior no Brasil se deve ao EaD, que democratiza a educação. “Cerca de 20% dos estudantes no Brasil fazem EaD. É imprescindível que nossa formação seja inclusiva”, defendeu. Para ele, quem é contra o EaD na saúde tem interesses corporativistas, com objetivo velado de reduzir a competição entre profissionais formados nas áreas da saúde.

Dorisdaia Humerez, do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) rebateu a crítica de que os conselhos são corporativistas ao defender o ensino presencial. “Seríamos se fizéssemos o contrário, pois assim teríamos mais profissionais no mercado e maior arrecadação”, disse. A representante do Cofen lembrou que “os profissionais da saúde formados na modalidade EaD também são vítimas desse processo”, pois serão colocados no mercado sem o devido preparo, estando expostos em um maior grau aos riscos de erro e, consequentemente, às punições éticas e sanções legais por esses erros. Ela assinalou que a modalidade de ensino é perversa também para a saúde da população, na medida em que pessoas vão morrer vítimas desses erros.

O presidente do CNS, Ronald Ferreira, reiterou a disposição do conselho de continuar lutando pelo ensino presencial de qualidade na graduação em saúde. Ele lembrou que o CNS publicou a Resolução nº 515/16, que alerta sobre os “prejuízos que tais cursos podem oferecer à qualidade da formação de seus profissionais”, conforme diz o documento. No entanto, frisou, os posicionamentos deliberados pelo CNS não têm sido respeitados. “É um ataque do mercado sobre os interesses da sociedade brasileira. Não somos contrários aos avanços tecnológicos, mas temos que participar do debate”, declarou.

O presidente do CFF, Walter da Silva Jorge João, que esteve na audiência pública acompanhado da vice-presidente, Lenira da Silva Costa, e dos membros da Comissão e da Assessoria parlamentares do conselho, saiu confiante do debate. “É preciso que fique claro que estamos lutando contra uma política de governo, em que o EaD é usado como ferramenta para atingir metas traçadas no Plano Nacional de Educação (PNE)”, salientou. “Não é uma missão fácil, mas acredito que a articulação política dos conselhos profissionais no Congresso Nacional e o apoio que conseguimos de vários deputados levará a uma solução desse problema. E a contribuição do CFF, que hoje detém a maior gama de dados sobre o EaD no país, tem sido crucial para lançar luz sobre os prejuízos iminentes à educação e à saúde.”

 

Fonte: Conselho Federal de Farmácia

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